segunda-feira, 26 de setembro de 2011

HELENA BOVARY KARIÊNINA (OU PERDOA-ME POR ME TRAÍRES)

Nestas bandas do Ocidente, a condenação da traição amorosa tem a idade do mundo. A Bíblia Sagrada, o pai de todos os best-sellers, escrito sob encomenda de um Deus cheio de ira, estabeleceu rigoroso índex proibitorium. Em dez tópicos, impunha as normas que o ser humano deveria seguir,  se não quisesse arder no fogo do inferno. No sétimo item, esbraveja-se: ´Não adulterarás!´ (Donde se pode inferir: o adultério seria contra-indicado  aos homens e às mulheres).
No décimo item, essa inferência se dilui: brada-se contra (quase) todos os tipos de cobiça: à casa do próximo; aos servos e às servas do próximo; aos bois e aos jumentos do próximo; aos pertences do próximo; à mulher do próximo. (Donde se podem extrair procedentes questões: 1. A mulher poderia cobiçar o homem da próxima? 2. O adultério seria prerrogativa masculina?)
Conclusão lógica e dedutiva, pelo registrado nesses milhares de anos – de mais trevas e menos luz – que nos contemplam: 1. A mulher não poderá cobiçar o homem da próxima; 2) O adultério será contra-indicado às  mulheres.
Ocidentais, herdeiros, bastardos ou não, dessa ordinária moral cristã (ok, Freud e asseclas vêm tentando, com êxito, deletar essa equação bestial dos nossos corações e mentes),  incorporamos, inconscientemente ou não,  o torpe raciocínio bíblico. Deu nisso: homens traem com mais naturalidade que mulheres. Mulheres traem reativamente;  ou por perceberem o óbvio: o adultério nasceu para todos.  
Não será necessário recorrer-se à trajetória trágica de Anna Kariênina, imortalizada no seminal romance homônimo de Tolstoi, para iluminar as diferenças entre o trair feminino e o trair masculino (Ok, Flaubert criou a libertina Emma Bovary, mas depois proclamou, e acredito no que disse: `Madame Bovary c´est moi!´). Há cerca de dois anos, sentei em mesa de bar do Leblon com Helena (nome fictício), amiga querida que não via havia muito tempo e que mora na Europa há décadas. Bem casada, profissional exitosa, conta bancária acima da média, analisadíssima, caiu em prantos após a primeira dose de caipivodca de  morango. Abriu-me o coração: sofria muito, muuuuuuito. Motivo: do nada,  surgiram-lhe dois amantes, ambos bons de cama, bonitos, bem-sucedidos profissionalmente, e loucos por ela.
Perguntei a Helena se não poderia fazer escolhas. Talvez se separar do marido. Foi enfática: - Não consigo tomar nenhuma decisão. Gosto de ter três homens loucos por mim. Mas morro de culpa. Toda mulher tem certa fascinação por esse tipo de situação que estou vivendo. Não devem ter.  É uma merda!  Estou arrasada!
Helena não tomou decisão alguma. O corpo que lhe pertence, tomou. Adoeceu. Há dois anos passa mais tempo em hospitais ingleses e franceses do que em casa ou no trabalho – ou na cama do agora único amante (o outro conseguiu descartar).
Dia desses, Helena, aos prantos, me confessou, ao celular, diretamente de Londres: - O que será de mim? Se tivesse sido traída pelo meu marido, que é que mais acontece por aí, minhas amigas estariam me paparicando. Mas não. Sumiram. É mais confortável ser traída do que trair, meu querido!
Haverá controvérsias. Cartas para a redação.

  





 

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