quarta-feira, 24 de outubro de 2012

MEUS DOZE MANDAMENTOS (OU CADA UM QUE VIRE A BUNDA NA DIREÇÃO QUE QUISER)


1. Escrever.
2. Caminhar.
3. Dizer sempre obrigado, com licença, perdão quando necessários. (Existem momentos da  minha vida pessoal, tão desgraçados, que sinto vontade de chorar quando alguém esbarra em mim sem querer e diz com sinceridade o seguinte mantra confortador: - Perdão, senhor! Perdão!)
4. Sentir compaixão pelos desvalidos que todos nós somos, fomos ou seremos. (A vida é merda e redenção para todos: taí uma regra sem exceção).
5. Dar adeusinho afetuoso a todo bebê ou criança que  cruzar o seu caminho e rir para você. Ese pequeno gesto poderá lhe garantir no mínimo sete dias a mais de vida, o que, a depender do caso, lhe pode ser uma boa ou má notícia).
6. Acarinhar gatos e cachorros como se fôssemos nós próprios – e fomos, somos, ou seremos gatos e cachorros.
7. Agir duas vezes antes de pensar.
8. Não se vitimizar nunca. Nasce-se vítima. Morre-se vítima. A desgraça é desígnio universal. A tempestade nasceu pra todos. Ninguém é totalmente feliz. A miséria é nossa marca registrada, tatuagem invisível que carregamos sob nossas peles desde a chegada até a partida. Ponto. O que nos resta fazer: surfar na própria merda até o fim dos tempos e let it be.
9. Quando incômoda e óbvia vontade de morrer nos invade, e a incômoda e óbvia vontade de morrer nos invade a todos, indistintamente, a toda hora e a todo lugar, tente aliviar a barra ingerindo aquelas santas pilulazinhas tarja preta. Se a dor não passar, vá mais além, pague pra ver. Que se fodam os outros: a dor de cada um é a dor de cada um, absolutamente pessoal e intransferível.
10.  Tomar pelo menos uma vez na vida: a) um sorvete de cocana (mix de coco com cachaça) em sorveteria francesa em esquina do Terreiro de Jesus, em Salvador. b) um ovomaltine do Bob´s em qualquer lugar do planeta.
11. Mande alguém – (que o incomode atrozmente) -  tomar no cu sempre que puder. A imprecação poderá lhe render o desemprego ou a perda de uma amizade, mas vale quanto pesa: mandar alguém tomar no cu, em retumbrante brado, é  libertador e redentor.
12. Quando tudo der absolutamente errado, aperte o botãozinho do foda-se, repita o mantra pessoal que o acompanha desde sempre, cague e, basicamente, ande.


quarta-feira, 17 de outubro de 2012

OS REIS MAGOS DE MEIA-TIGELA DOS ALTOS SERTÕES DA BAHIA (OU ÉRAMOS QUATRO)


Éramos quatro.
Éramos quatro Reis.
O primeiro rei: Benedito (de Souza Reis). Nascido em 1952.
O segundo rei: Orlando (de Souza Reis). Nascido em 1952.
O terceiro rei: Antonio Martiniano (de Souza Reis). Nascido em 1953.
O quarto rei: Rogério (Reis de Souza Menezes). Nascido em 1954.
Não nos tornamos Reis por originarmos de ascendências nobres, ou por conquistarmos terras ao redor do mundo ao custo de muito sangue e de muita morte e de muitas armas de fogo e de muita guerra e de muita tirania. Viramos Reis por acaso.
Os quatro primos ganhamos o sobrenome Reis por termos nascido no dia de Reis, 6 de janeiro, data do calendário cristão celebrada com grandes festejos pelos quatro cantos do mundo, e considerado momento especialíssimo, pelos experts das artes divinatórias, como excepcional momento para escaparmos do ventre de nossas mães e mergulharmos neste vale de lágrimas. (Uns otários esses experts!)
Evidência ululante: nossos pais - os irmãos Francisco, Miguel, Baraquísio e Águida – acreditavam piamente, cheios de sonhos de progresso e de gloriosos augúrios para os seus rebentos recém-chegados: essa palavra literalmente poderosa – Reis  imprimiriria e impregnaria às vidas desses quatro primos existência exitosa, gloriosa, vitoriosa, venturosa e consagradora. Numa palavra: redentora.
Reza a lenda: em 6 de janeiro do ano 1 D.C., duas semanas depois de Jesus Cristo nascer, três reis magos Gaspar, Melchior e Balthazar o visitaram – e lhe presentearam com ouro, incenso e mirra, e o embalaram com seus braços fortes, mas carinhosos.
Trapaças da sorte, um quarto rei mago, Artaban, o que levaria rubis, pérolas e safiras para o recém-nascido, perdeu-se pelo caminho. Não conseguiu alcançar os companheiros – e perdeu a chance de se imortalizar em milhares de gravuras e efígies que percorreram e percorrem o mundo desde então, registrando esse momento histórico.
O meu primo Benedito, o filho de Francisco, foi o Artabã da nossa família pelo lado materno, os Souza. Teve vida meteórica: morreu dois dias depois de ter nascido. Não teve tempo sequer de perceber o formato do seio materno ou a miséria do mundo.
Sobramos os outros três primos Reis: Antonio Martiniano, Orlando, e eu. A nossa sobrevivência, posso presumir, certamente encheu Baraquísio (pai de Antonio Martiniano), Miguel (pai de Orlando) e Águida (minha mãe) de muitas alegrias. Nós três, eles teriam pensado e desejado, seríamos tão vitoriosos e bem-sucedidos quanto os eternamente  célebres Balthazar, Gaspar e Melchior.
Ao contrário de Benedito, o primeiro Reis a morrer, Antonio Martiniano, Orlando e eu crescemos viçosamente, tivemos infâncias felizes, adolescências imersas em alegrias e tristezas, num chiaroscuro típico dessa fase da vida humana, e chegamos, são e salvos à vida adulta.
Foi a partir dessa vida adulta que os três primos Reis se tripartiram. Cada primo Reis trilhou o caminho que tinha de percorrer. Cada primo Reis percebeu as agonias e as glórias de viver. Cada primo Reis descobriu a dor e a delícia de ser o que é. Enfim, coisas da vida, cada primo Reis pegou a sua reta. Cada primo Reis picou a sua mula. Cada primo Reis caiu na estrada e perigou ver – e viu.
O Reis Rogério sempre quis ser cidadão do mundo. Nunca conseguiu ficar parado no mesmo lugar. Tinha, e tem, espírito de bicho-carpinteiro. Sempre quis pagar para ver. Aos três anos, se mudou de Mutúipe, onde nasceu, às margens plácidas do Vale do Rio Jequiriçá, para Jequié. Aos 14, seguiu para Salvador, onde morou até os 31. Em seguida morou 12 anos em São Paulo, 10 em Brasília, e vive há quatro anos e meio no Rio de Janeiro.
O Reis Orlando sempre foi bicho do mato. Tímido. Caladão. Doce. De pouco falar. Gostava mesmo era de morar na fazenda do pai Miguel. Não queria saber de cidade grande. Sempre em eterno trabalhar, em eterno plantar e colher, colher e plantar, desde criança. Gostava de correr livremente pelas brenhas da caatinga dos altos sertões da Bahia, como se fosse um tatu. Ou uma lagartixa. Ou uma preá. Como se fosse mais bicho que homem (e bicho é, e será, sempre melhor que homem). De tanto ficar no mesmo lugar, o Reis Orlando virou paisagem rural. Sempre quando me lembro da fazenda de Tio Miguel, no Vale do Jequiriçá, revejo, reluzindo no meio dos matagais, os olhos esplendidamente verdes do Reis Orlando.
O Reis Antonio Martiniano era moreno danado de bonito: mas essa boniteza nunca fez dele cara arrogante, metido-a-sebo, como se dizia no sertão da Bahia em tempos de antanho. Ele era meio cismado. Cabreiro. Uma eterna tristeza no olhar, sabe-se lá de onde vinha. Não era muito de ir daqui para ali ou dali para acolá. Preferia a quietude. Sempre morou na roça, na fazenda de Tio Baraquísio, ou na casa da família em Valença-Bahia, sempre como se estivesse fora do lugar. Nunca soube de seus amores e de seus desamores. Nós nos gostávamos muito entre a infância e a adolescência. Eu o chamava de Reizinho. Ele me chamava de Roge. Mas nunca me contou nenhum segredo. Mas devia ter muitos. Quem não os tem? Fomos crescendo. Fomos nos afastando. De repente eu sumi. De repente, ele sumiu.
Epílogo
1.    O Reis Orlando continua vivo e fraco e tímido e caladão e doce. Mora no mesmo lugar onde  nasceu há 60 anos. Passa o dia no mato cuidando do roçado, e para o Reis Orlando a vida nada mais é que imenso roçado. De noite vai para a cama com as galinhas, ao lado da mulher simplória de sempre e para quem também a vida é imenso roçado. Tem filho muito bonito, rapagão de trintanos também chamado Antonio Martiniano, como o nosso primo Reis, e como o nosso avô, pai de minha mãe  e dos pais dos outros três primos Reis. Tem uma neta belíssima, Maria Rita, tão esplendorosa que, se surgisse de repente em algum lugar hype de São Paulo, alguém a descobriria e a transformaria numa Giselle  Bündchen. Mas desconfio: também para Maria Rita a vida será apenas imenso  roçado.
2.    O Reis Antonio Martiniano, talvez para afundar alguma amargura nunca revelada ou amores nunca materializados, tomou todas as que tinha direito, e muitas e muitas mais. Bebeu. Bebeu. Bebeu. Bebeu. Bebeu até cair morto. Varado pelo alcoolismo crônico, com pouco mais de trinta anos. Ave, Reizinho!
3.    O Reis Rogério continua vivo, talvez forte, e ainda tentando pegar, matar e comer – & quá um velho Carcará.
4.    Talvez o Reis Benedito, nosso Artaban, o primeiro a cair, o que nem teve tempo de perceber o quão viver é muito perigoso, tenha sido o mais feliz desses quatro Reis que nada tiveram ou têm de Reis, magos ou não. 
     

domingo, 7 de outubro de 2012

TODO HOMEM É BABACA ATÉ PROVA EM CONTRÁRIO (OU AS DIVINAS TÁBUAS DA LEI)


I.          Todo homem é babaca – claro, com as exceções de praxe que confirmam a regra.
Adendo 1: Ungido biblicamente à condição imobilizadora de rei dos animais, massacrado pelo divina obrigação de ser o provedor da família, o homem se fodeu: transformou o  cérebro eventualmente potencializador em coração vagabundo(e não o contrário, como deveria); afundou a bunda flácida sobre a poltrona localizada em frente à tevê; e hoje vive geralmente da dependência química que o pênis exerce nas mulheres, e, noblesse oblige, em outros homens.

II. Todo gay é babaca – claro, com as exceções de praxe que confirmam a regra.
Adendo 2: Dragados pela homofobia em vigor desde que o mundo é mundo, os gays nos deixamos vitimizar, sem as exceções de praxe. A partir de meados do século passado reagimos, ocupamos legitimamente o espaço que nos cabia, e cabe, e caberá, no nosso tecido social. Angústia da influência – embora muitos de nós ainda cometamos o pecado mortal da vitimização: caímos em tentação; subimos no salto; quisemos crer, entre outras bobagens, que éramos seres ´especiais e mais sensíveis´; e passamos a nos achar o rei, ou a rainha, dos animais – com as exceções de praxe que confirmam a regra. 

III.  Toda mulher tende a ser babaca, e a se vitimizar – claro, com as exceções de praxe que confirmam a regra.

Adendo 3: Ossos do ofício, biblicamente e emblematicamente reduzida a uma costela retirada do corpo de um homem, a mulher foi à luta; queimou sutiãs; aprendeu as artimanhas da traição, arquetipicamente masculina; percebeu – e  disso se aproveitou – o fato de o homem, e, noblesse oblige,  outras mulheres, serem dependentes químicos de suas vaginas; fez do lesbianismo opção existencial e comportamental; pôs a cara a tapa; redobrou o fôlego; e, em 2012, se tornou o melhor  da raça humana – claro, com as exceções de praxe que confirmam a regra.

Donde se pode e se deve inferir, sabiamente:  haverá hoje no planeta Terra mais homens e gays babacas do que mulheres babacas.

Tenho dito.



segunda-feira, 1 de outubro de 2012

PÍLULAS DE VIDA DO DOUTOR ROGER (OU UM MANUAL DE BAIXA-AJUDA - VOLUME 1)


·    Tudo acaba bem no final: todos nós morremos.
·    A razão é a mais grave forma de loucura: é incurável.
·    Quanto mais rezo mais assombração me aparece.
·    Polyana morreu de overdose de jujuba.
·    Ser anta é ser feliz.
·    Se o mundo fosse bom o dono morava nele.
·    Amar é jamais ter que pedir perdão.
·    Dormir é brincar de morrer.
·    Por um mundo menos humano.
·    Prefira um algoz eventual a uma eterna vítima.
·    A diferença entre cagar e foder é questão de vetor.
·    A cavalo dado não se olha os dentes. Apenas o pênis. Geralmente duro. Se não estiver, pode devolver.
·    A vida só acaba quando termina.
·    Político bom é político morto.
·    Índio bom é índio nu.
·    Quando um burro fala, o outro murcha a orelha.
·    Quem vê cara não vê cu.
·    O amor que fica é o amor de pica.
·    Se merda valesse dinheiro, pobre nasceria sem cu.